O curau, ou mingau de milho verde, é apenas um dos diversos pratos culinários à base de milho presentes na cultura alimentar de algumas regiões do Brasil.
Em Minas, cresci comendo curau como sobremesa, feita por avós, tias, mãe…sinto até hoje o cheiro impregnado nas cozinhas. Na minha família se faziam muitos doces! Numa época em que não se tinha muito medo do açúcar.
Eu, numa noite cansada de trabalho acadêmico, olhei as 4 espigas de milho verde na fruteira e enxerguei um curau. Lembrei da infância, das mulheres da família que me antecederam e que me ensinaram a gostar de cozinhar. Lembrei do poema “Oração do Milho”, da Cora Coralina. Debulhei o milho em oração…fiz o curau e ficou delicioso!
Segue abaixo o poema da Cora e a receita do meu curau.
Oração do Milho
Sou a planta humilde dos quintais pequenos e das lavouras pobres.
Meu grão, perdido por acaso, nasce e cresce na terra descuidada. Ponho folhas e hastes e se me ajudares Senhor, mesmo planta de acaso, solitária, dou espigas e devolvo em muitos grãos, o grão perdido inicial, salvo por milagre, que a terra fecundou.
Sou a planta primária da lavoura.
Não me pertence a hierarquia tradicional do trigo. E de mim, não se faz o pão alvo, universal.
O Justo não me consagrou Pão da Vida, nem lugar me foi dado nos altares.
Sou apenas o alimento forte e substancial dos que trabalham a terra, onde não vinga o trigo nobre.
Sou de origem obscura e de ascendência pobre. Alimento de rústicos e animais do jugo.
Fui o angú pesado e constante do escravo na exaustão do eito.
Sou a broa grosseira e modesta do pequeno sitiante. Sou a farinha econômica do proletário.
Sou a polenta do imigrante e amiga dos que começam a vida em terra estranha.
Sou apenas a fartura generosa e despreocupada dos paiois.
Sou o cocho abastecido donde rumina o gado
Sou o canto festivo dos galos na glória do dia que amanhece.
Sou o cacarejo alegre das poedeiras à volta dos seus ninhos.
Sou a pobreza vegetal, agradecida a Vós, Senhor, que me fizeste necessária e humilde
Sou o milho.
Receita do curau
Ingredientes
4 espigas de milho debulhados;
2 xícaras (chá) de leite; ou um pouquinho mais, se gostar mais mole;
3/4 de xícara (chá) de açúcar, ou um pouco mais se gostar mais doce;
Canela em pó a gosto para salpicar.
Modo de fazer
Retirar as cascas e lavar as espigas. Cortar com faca (debulhar) as espigas, ou ralar. Após isso, adicionar o leite e bater no liquidificador, ou com o mixer. Colocar em coador, separar o leite engrossado do bagaço. Pode usar uma colher para pressionar na peneira. Jogue fora o bagaço ou reaproveite para outra coisa.
Adicionar o açúcar e levar ao fogo médio. Mexer em círculo com colher de pau, sem parar (para não empelotar) até dar consistência de mingau/creme mais grosso, porém liso. Retirar do fogo, despejar em tigelas pequenas, salpicar canela (a gosto) e levar à geladeira por aproximadamente 1 hora.
Bom apetite!