Churrascos de Paróquias.
Festas dominicais de igrejas são algumas das lembranças que tenho mais viva em minha memória.
Acordar domingo cedinho na casa de minha avó, com o sino da igreja batendo da maneira mais escandalosamente feliz que poderia bater, eepocar de fogos e o auto falante anunciando o que será o dia, é uma coisa inesquecível. Sinal que o domingo seria de alcatrão, maionese, arroz, farofa e o que mais o açougue da cidade pudesse proporcionar.
Passar o dia em comunidade, compartilhando espaço nas grandes mesas de bancos de madeira com pessoas da cidade, sorrisos da cidade, histórias repetidas e aumentadas de ano para ano, era uma coisa mágica.
Lembro que antes da igreja da cidadezinha que morei não ter seu próprio salão de festas, os churrascos eram feitos em uma espécie de recanto, à beira do “Rio das Almas”, embaixo de árvores e de pássaros descuidados. Foram alguns dos melhores domingos de minha vida. Acabar a tarde dentro do rio é de levar para sempre.
Tenho a sorte de morar em um lugar de Curitiba onde muito destas coisas ainda presencio. Um lugar onde ainda reina o silêncio, as árvores e pássaros e esta convivência fantástica que apenas a comida e a fé pode trazer, mesmo eu não sendo nem um pouco religioso.
A poucas quadras de minha casa, em uma pequena igrejinha, estas festas de domingo são frequentes. Um cheiro de carne na brasa logo cedo, um estrondo de fogos de artifício e pronto, a senha para celebrar qualquer padroeira foi dada. É a hora de acordar, tirar a família da cama, pegar um jogo de talheres e ir para o barracão comer o Churrascão de Igreja.
Aqui no Paraná, estes churrascos são sempre marinados, para o terror dos churrasqueiros mais ortodoxos. Esta marinada é proveniente da região da Renânia, na Alemanha. Era usada como forma de conservação de carnes bovinas, antes do surgimento dos refrigeradores.
“Numa tina preparava-se a marinada ou vinha d’alhos, e as peças de carne (os contra-filés com o osso separando a parte da alcatra da parte do mignon) eram submersas no líquido para adquirir sabor e amaciar a textura quando submetidas ao braseiro.
A vinha d’alhos era composta de: cebola picada, alho socado, cebolinha cortadinha, noz-moscada ralada, louro em pó, sal e vinagre ou vinho branco. Estes dois últimos podem ser substituídos por suco de limão.”
Fonte: Tradicionalismo e folclore na Cultura Alimentar Paranaense – Ivan Koch
Nas festas tradicionais de igreja, estes filés são servidos em pratos de papelão. Os acompanhamentos, servidos à parte, são a maionese caseira, arroz soltinho e a farofa de farinha de mandioca.
Um belo filézão, suficiente para um almoção dominical para três pessoas.
Estes alcatrões tem o sabor de saudade. Não consigo entrar em um salão assim sem ser remetido para o período mais feliz de minha vida, onde tudo era só alegrias e as surpresas boas de cada dia.
É engraçado, mas não me lembro de nenhuma festa assim com chuva. Nisto, padres são craques, escolhem os melhores dias para estas comemorações.
Claro que não é só de alcatra que a festa é feita. Dependendo da paróquia e da boa vontade da comunidade, você pode encontrar linguiças, frango, costeletinhas de porco e até uma Costela fogo de chão, como foi o caso desta de hoje aqui pertinho de casa.
Confesso: por maior que fosse a vontade de ter participado desta festa, não fui. Estava com restaurante já reservado para o dia de hoje. Porém, ter entrado no ambiente, sentido o cheiro de carnes preparadas com todo o carinho, olhar a alegria na feição de todas as pessoas presentes, já alegrou todo o domingo.
Fica minha promessa de na próxima festa, no próximo Churrascão de Igreja, ser um dos primeiros da fila. Com garfo e faca, espírito aberto e coração e pensamento em um tempo que nunca esquecerei.