Comendo no século XIX

Fal Azevedo em mais uma linda crônica.

L'Absinthe - Degas

Durante o século XVIII, a palavra menu já era empregada na França, só que nas cozinhas. A palavra originou-se de ecriteau, que era uma expressão usada para designar uma ordem interna de serviço, que apenas informava aos empregados a sequência dos pratos e vinhos a serem servidos num jantar.

Menu passa a ser usado para informar aos clientes dos restaurantes sobre as possibilidades das refeições no século XIX.

 

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No começo do século XIX, para alimentar melhor seu exército (que era chamado de Grand Armée, Grande Armada – que nome lindo), Napoleão Bonaparte ofereceu um prêmio a quem inventasse um jeito de conservar os alimentos.

O ganhador foi Nicolas Appert, que provou que os alimentos fervidos em recipientes de vidro e depois fechados hermeticamente duravam muitos meses.

Depois disso, P. Durand, um inglês, substituiu os recipientes de vidro por latas, o que facilitava o transporte.

A princípio, os alimentos enlatados não eram muito usados nas casas comuns, por serem muito caros. Eram usados principalmente nas viagens marítimas e pelos exércitos.

A próspera classe média inglesa adorava imitar os hábitos da aristocracia. Pela primeira vez na história, móveis e objetos de decoração eram feitos em série. Acima de certo nível financeiro, todos podiam consumir as coisas mais incríveis. As salas vitorianas eram entupidas de quinquilharias, as cozinhas eram equipadíssimas, todas as donas de casa burguesas tinham jogos de louça separados para o uso cotidiano e para as ocasiões especiais (sabe aqueles cacarecos que você guarda “para as visitas”?). Isso era um luxo até então reservado à nobreza.

Nossa forma de conviver mudou. A burguesia emergente precisava aprender novos códigos de comportamento. A etiqueta durante a era vitoriana se sofisticou: era rígida, complicada, minuciosa e visava tanto estabelecer normas para um convívio civilizado e agradável, quanto servir de barreira social. Ahá! Pensa bem. A maneira de falar, andar, sentar, vestir-se, manejar talheres e muitas outras coisas classificam o indivíduo em nossa sociedade. E incluem ou excluem esse indivíduo de determinados grupos. Assim sendo, se você não sabe que vinho servir com a carne e nem manejar a pinça de comer escargots, mon dieu, nós não pertencemos ao mesmo círculo social.

Para a burguesia vitoriana, a casa virava um refúgio. Ali não precisávamos pensar no mundo que mudava muito depressa e nos assustava, nem no abismo social que criávamos ao ganhar dinheiro, nem precisávamos nos preocupar com a concorrência. Em nossos lares burgueses, abarrotados de tralhas, recheados de papéis de parede, cortinas, mesinhas e castiçais, podíamos receber nossas visitas, brincar de aristocratas e pendurar tabuletas que diziam Home Sweet Home. Uma casa burguesa bem abastada tinha de 15 a 20 empregados.

 

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No finzinho do século XVIII, um médico chamado Pierre Ordinaire cria um remédio para dor de estômago, a partir de ervas como losna, anis e funcho. O Absinto. Que não, não é um licor. É um destilado. Daí, esse médico cabecinha torta inventa de botar álcool na mistura.

Pronto. A Fada Verde

Essa bebida ficou popular mais pro final do século XIX. O teor alcoólico é um absurdo, coisa de 54%. E gente como Rimbaud, Verlaine, Van Gogh, Toulouse Lautrec, Baudelaire, Manet, Degas e Picasso, bebiam. Foi proibida em 1915, claro, naquela droga de século XX.

O Absinto foi a bebida emblemática do século XIX. Tim tim.

 Em 1869, uma epidemia dizimou o gado francês, o que tornou a manteiga escassa e cara. Napoleão III pediu para que se inventasse um substituto. O químico francês Hippolytte Mege Mouries inventou a margarina. A princípio, ela era fabricada apenas com gorduras animais, mas no comecinho do século XX descobriu-se como solidificar óleos vegetais e aí a margarina virou essa droga que todos nós conhecemos e detestamos.

A culinária francesa atingiu seu apogeu em meados do século XIX. Nos restaurantes e nas casas burguesas a comida era estupenda. Almoços de negócios e banquetes já eram comuns. Em 1900, um jantar em homenagem a 22 mil prefeitos franceses reuniu 1800 maitres que pilotavam bicicletas para cumprir suas tarefas ao redor de sete quilômetros de mesas.

Na virada do século XX, havia 15 mil restaurantes em Paris, 20 mil cafés e milhares de negociantes de vinho.

Di-li-ça.

Orlando Baumel

Chef de Cozinha, músico e sócio do site junto com a Carol. Casado, pai de 3 lindas garotas.

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