Lardo é um tipo de embutido feito com a gordura que fica acima da paleta do porco, feito apenas de gordura maturada com sal e ervas por seis meses dentro de cubos de mármore branco da região dos Alpes italianos, em Colonnata. É feito exatamente da mesma maneira, desde os romanos. Pode ser que você nunca tenha ouvido falar em Colonnata, mas algo de mágico acontece ali. A história do povoado, que faz parte da Província de Massa Carrara, se confunde com a de um dos tipos de mármore mais nobres do mundo, o mármore de Carrara, extraído das montanhas que o circundam desde 1000 a.C.

Foi durante o Império Romano que o ritmo de extração se acelerou, e daquelas montanhas saiu todo o mármore que recobriu os grandes monumentos romanos. A vida nas minas, porém, era o oposto de grandiosa; diante de um frio constante, o trabalho exigia esforços físicos desumanos e o risco de desabamento dos imensos blocos de mármore era sempre iminente. Mas, além do sustento financeiro dos mineradores da região, o mármore da montanha oferecia condições ideais para curar e conservar um alimento importante, o lardo.

Lardo

O lardo é um produto difícil de encontrar pelo Brasil. Foi com surpresa que encontrei aqui em Curitiba um lardo produzido por um frigorífico da região. Claro que não tem todas as características presentes no lardo original de Colonnata, mas o sabor e a textura são inebriantes igual.

Considerado originalmente um salume de pobre, o lardo é elaborado com a camada de gordura que recobre o dorso do porco. Os ricos usavam os cortes nobres e aos trabalhadores restava alguma carne e muita gordura. Justamente desse resto, os mineradores obtinham as calorias necessárias para aguentar as duras jornadas de trabalho. E tratavam de conservar a gordura: recobriam os pedaços com sal grosso e ervas dos campos locais e deixavam-nos maturar dentro do mármore da montanha. Ali, conservava-se por mais de um ano.

Registros históricos apontam que o lardo é mais antigo que Colonnata (cuja origem oficial é 1111 d.C.), mas foi nesse vilarejo que o lardo ganhou popularidade e, em 2003, a certificação europeia de indicação de origem protegida, tornando-se “Lardo di Colonnata I.G.P.”

O processo de elaboração mudou pouco ao longo dos séculos. A grande “modernização” foi o fato de a cura não ser mais feita dentro das minas, mas no vilarejo. Ali, foram instaladas grandes caixas de mármore (um meio-termo entre uma banheira e um túmulo), chamadas de “conche” no plural ou “conca” no singular, feitas a partir de um só bloco da pedra, nas quais camadas intercaladas de lardo e temperos curam por pelo menos seis meses.

Antes de receber as peças, as paredes da caixa são esfregadas com alho. Os pedaços de gordura são cortados de maneira a formarem entre si um encaixe perfeito, sem buracos, e, entre uma camada de lardo e outra, adiciona-se abundante sal marinho grosso, alho, pimenta-do-reino, alecrim e especiarias, em geral canela, cravo, louro, noz-moscada, anis-estrelado, orégano e sálvia. Finalmente, a conca é fechada com uma grande tampa de mármore. E é aí que a magia realmente começa.

Lardo 1

O mármore é poroso, mas não muito, permite a entrada da umidade externa sem deixar os líquidos saírem. Essa condição, combinada com o microclima úmido e frio da cidade, faz que as conche se encham de água, que, misturada ao sal colocado sobre o lardo, forma um a preciosa salmoura, que serve como conservante natural, envolve e isola as peças.

O lardo é um ingrediente versátil, podendo ser utilizado em diversas preparações, desde acompanhando uma massa, em torradas, em carnes, frutos do mar e aves, até sozinho. O sabor é surpreendente. Não é a toa que é chamado de Foie Gras italiano.

Fonte: Revista Paladar Estadão

Para ilustrar esta matéria, busquei uma receita que mostrasse bem esta versatilidade. Fui encontrar na Revista Gula uma receita que fez parte do cardápio do Restaurante Fasano, um ícone na gastronomia brasileira. Repasso ela para nossos leitores sem nenhuma modificação, apenas utilizando o lardo que encontrei por aqui. Foi através dela que preparei o prato de hoje.

Tartar com lardo

Tartar com Lardo di Colonnata  –  Chef Luca Gozzani   –   Restaurante Fasano

INGREDIENTES

Tartar

  • 60 gramas de filé mignon bem picado na faca
  • 1/2 colher de café de mostarda
  • 1 colher de café de maionese
  • 1 gota de tabasco
  • 1 gota de molho inglês
  • 5 colheres de café de azeite extravirgem
  • Sal a gosto
  • Pimenta-do-reino a gosto

Creme de cogumelos

  • 100 gramas de cogumelos mistos (champignon e porcini)
  • 1/4 de dente de alho picado
  • 1 colher (sopa) de azeite
  • 4 colheres (sopa) de vinho branco
  • 1 copo de caldo de carne
  • 3 fatias de lardo bem finas
  • Migalhas de pão de forma torradas e temperadas com um fio de azeite

PREPARO

  • Refogar o alho no azeite e colocar os cogumelos em pedaços, sal e pimenta-do-reino
  • Após 5 minutos, acrescentar o vinho branco, deixar evaporar e colocar o caldo para cozinhar por mais 5 minutos
  • Bater tudo no liquidificador
  • Temperar a carne com a mostarda, maionese, azeite, sal, pimenta, tabasco e molho inglês
  • Enrolar um pouco de tartar em cada fatia de lardo
  • Colocar no prato por cima do creme quente e servir com as migalhas de pão

Tartar com lardo 1

Orlando Baumel

Chef de Cozinha, músico e sócio do site junto com a Carol. Casado, pai de 3 lindas garotas.

Este post tem 2 comentários

  1. Camile

    Olá, aonde encontrou em Curitiba este produto para comprar?

  2. Odilon Silva

    Em Florianópolis a charcutaria Duca produz um delicioso lardo.

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